quarta-feira, 13 de abril de 2011

ITÁLIA

Fonte: Andrea Montanari in La Repubblica, 13/4/2011.

Sigmund Freud, quando estava assim meio down, não ia para Porto Alegre. Ia para a Itália. Ia umas 50 vezes por ano para a Itália. A Itália era uma espécie de elixir para ele, uma espécie de paraíso, uma espécie de utopia. Lá ele reencontrava Leonardo, lá ele se extasiava com Michelangelo, lá ele se deparava com a metáfora mais perfeita da psique humana, a cidade de Roma e suas ruínas, suas reconstruções, suas histórias sobrepostas de tal maneira que em uma mesma cidade convivem séculos diferentes, a época mais longínqua com a mais recente, a única cidade do mundo que é uma banda de Moebius, ou seja, que você caminha pelo mais antigo e de repente, sem perceber, está caminhando pelo mais moderno – é uma bela definição para o inconsciente e foi dada por Jacques Lacan: o inconsciente não está no “interior” do sujeito, escondido ou soterrado, na infância, nem no “exterior”do sujeito, à mostra, na cara, na vida adulta, mas está na conjunção, na fusão, na condensação do interior com o exterior. Como se uma fotografia fosse sobreposta à milhares de outras fotografias, e aqui já retornamos a Freud. É esse o sujeito dividido que o Eu tenta dar uma fachada de unidade, tenta fazer pose de uma coisa só, a coisa que acredita ser aquilo que pensa, a coisa que se quer dono do pedaço quando é no máximo inquilino, paga aluguel direitinho sem se dar conta desta conta. Pois bem, eu que volto umas 300 vezes por ano para a Itália, me deparei hoje com essa notícia deliciosa, saborosa, apetitosa. A notícia diz que na belíssima região da Lombardia, na cidade de Brianza, ao norte de Milão, a seção regional do partido político fascistinha Povo da Liberdade presenteou o primeiro ministro fascistão Silvio Berlusconi com um kinder-ovo gigante de páscoa de 2 metros de altura. E aí, logo depois da meia-noite – quem disse que a política italiana não é inventiva, não faz uma clara referência à Cinderela? - qual foi o brinquedinho que saiu para fora da abóbora-ovo? Saiu Charlotte Crona tocando violino!! Sensacional!! Quem é Charlotte Crona? Trata-se de uma mulher...espere, como defini-la? Ela é, digamos, uma surpresinha, uma artista prendada, uma sueca que toca violino muito bem. Reparem no toque, ai, ai, ai, de cultura desta cereja no topo do ovo: ela toca violino!! Eu estou encantado, fascinado, esqueci de todas as dores. Não me interessa mais o desgoverno da Itália, não me interessam os processos judiciais contra o primeiro ministro, não me interessa mais a dor que não pode ser publicada. Charlotte Crona saiu do ovo tocando violino! É isso a Itália! Coisas de magia.

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